De acordo com a Associação Brasileira de Endometriose e Ginecologia Minimamente Invasiva, estima-se que mais de 6 milhões de mulheres sofrem de Endometriose no país. “Essa é uma enfermidade que tem início no sistema reprodutor, mas pode atingir intestino, bexiga… Quando é um caso de endometriose mais avançada, ela forma fibrose. Isso pode ainda levar à infertilidade. Sem falar que, quando é um quadro avançado, a mulher tem uma dor muito intensa na região pélvica, o que dificulta muito a qualidade de vida”, explicou a ginecologista. Confira a seguir a entrevista que a ginecologista Cristina Sá concedeu ao Bahia Notícias.
Quais sintomas devem criar um alerta para a possibilidade de endometriose?
O que mais vai criar um alerta é em relação à cólica. A mulher que passa a ter cólicas cada vez mais intensas deve ter muita atenção. Algumas meninas já têm uma predisposição à endometriose e, na adolescência mesmo, elas já começam com cólicas menstruais muito intensas. Isso aponta uma chance de desenvolver endometriose. Outro fator muito relevante é a dor durante a relação sexual. Mulheres que sempre sentem dor durante a relação sexual precisam investigar o que causa.
Como é feito o diagnóstico? Há fatores que aumentam o risco?
O fator hereditário é muito relevante. Com relação ao diagnóstico, é clínico e de imagem. Hoje a gente tem tanto a ressonância magnética quanto a ultrassonografia transvaginal para investigação de endometriose profunda, que é o procedimento padrão ouro para diagnóstico.
Existe alguma nova tecnologia que tenha facilitado o diagnóstico e também oferecido novas formas de tratamento para endometriose?
No caso do diagnóstico, há a ultrassom que investiga endometriose profunda. São poucos profissionais que fazem, realmente especializados nesse exame. É um exame muito demorado, tem que fazer um trabalho intestinal na paciente, para poder observar lesões de endometriose no útero, ovário, bexiga, intestino… É um profissional extremamente capacitado. Com relação ao tratamento, a gente tem tratamento medicamentoso, com o objetivo de controlar e, em alguns casos, diminuir as lesões da endometriose. Alguns casos são cirúrgicos, mas hoje a gente já sabe que é a minoria. Antigamente, todo mundo operava de endometriose. Existem alguns fatores que podem melhorar a qualidade de vida das mulheres com endometriose, como alimentação saudável, aumentando a ingestão de alimentos com ação anti-inflamatória (como gengibre, alho macerado, açafrão, peixes ricos em ômega 3…) e atividade física regular.
Como funciona o tratamento cirúrgico?
Varia de caso a caso. Tem pacientes que precisam tirar um fragmento do intestino, outros têm endometriose no ovário, então precisam tirar. Realmente varia de caso a caso. A endometriose é uma doença que vai invadindo e se instalando nessa região. Cada mulher pode apresentar de forma diferente.
De que forma a mulher é afetada quando a endometriose se espalha para além do sistema reprodutor?
Essa é uma enfermidade que tem início no sistema reprodutor, mas pode atingir intestino, bexiga… Quando é um caso de endometriose mais avançada, ela forma fibrose. Isso pode ainda levar à infertilidade. Sem falar que, quando é um quadro avançado, a mulher tem uma dor muito intensa na região pélvica, o que dificulta muito a qualidade de vida.
É verdade que suspender a menstruação é positivo para mulheres com endometriose? Qual a relação entre as duas questões?
É porque, em todo período menstrual, a mulher sangra também onde existe foco de endometriose. Com isso, aumenta a inflamação desse local e aumenta a fibrose. Com a suspensão da menstruação dessa mulher, ela fica sem sangrar e reduz esse foco, então é realmente muito positivo.
Suspender a menstruação é uma questão muito controversa no geral. No caso de mulheres saudáveis, pode causar problemas?
No caso de mulheres saudáveis, a suspensão da menstruação é apenas desejo da mulher. Tem mulheres que não gostam de menstruar, outras não se sentem bem no período menstrual, têm alergia a absorvente… Suspender a menstruação nessas mulheres não vai causar transtorno nenhum. No entanto, não é uma indicação clínica, parte apenas de um desejo.
Como o uso de hormônios – seja em anticoncepcional, pílula do dia seguinte ou até mesmo tratamentos hormonais – pode influenciar na saúde da mulher? Há algum prejuízo, como para a fertilidade?
A pílula do dia seguinte tem que ser abordada de forma isolada, porque ela não pode ser considerada um método anticoncepcional. Tem adolescentes e adultas jovens, principalmente, que adotam a pílula do dia seguinte como método contraceptivo, mas não é. A taxa de eficácia é mais baixa, e a dose de hormônios é muito alta. Ela é para ser usada em uma emergência. Com relação aos anticoncepcionais, hoje a gente tem uma taxa de eficácia muito segura. Principalmente no caso dos orais, o retorno da fertilidade é muito rápida, então normalmente não causa nenhum prejuízo para a mulher.
No Carnaval deste ano, a prefeitura disponibilizou, nos postos de saúde, pílulas do dia seguinte. Esse tipo de ação pode ser considerada negativa, já que o uso frequente não é indicado?
O que eu acho que falta na nossa população é a cultura do preservativo. A população brasileira precisa ter a cultura do preservativo, principalmente nessas épocas de festa, quando se tem relação com parceiros desconhecidos e que talvez não veja nunca mais. Eu não acho negativa essa ação da prefeitura de disponibilizar pílula do dia seguinte, mas me pergunto se isso não seria um incentivo. A gente mora em um país onde o aborto é proibido, então uma gravidez originada de uma relação casual pode ser um problema muito grande para a mulher. Eu não acho que seja negativa essa ação, porque acredito que a mulher tem o direito de fazer o que quer com o corpo dela, mas o que acho que a gente precisa incentivar é o uso do preservativo. A gente tem, aqui em Salvador, um índice de HPV altíssimo. É a capital que tem a maior incidência de HPV e HTLV. A sífilis está voltando em todo o país também. Insistir no preservativo é fundamental.
Algumas jovens utilizam a pílula do dia seguinte após cada relação sexual. De que forma isso pode prejudicar a saúde?
Primeiro que ela vai causar um descontrole enorme no ciclo. Aquilo é uma dose de hormônio muito alta, que é feita para justamente parar a ovulação naquele ciclo ou, pelo menos, modificar rapidamente o muco cervical ou o endométrio. Só que ela tem uma taxa de eficácia baixa com relação ao anticoncepcional. Ela aumenta a incidência de gestação ectópica, que é a gestação na trompa. Ainda assim, mesmo usando pílula do dia seguinte, acontecem gestações. Muitas mulheres usam pensando que vai funcionar, mas não funciona como o uso de anticoncepcional. É apenas em casos de emergência.
Fonte: Bahia Notícias